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“Não estejais inquietos por coisa alguma...” Filipenses 4.6a



“Não estejais inquietos por coisa alguma; antes, as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus, pela oração e súplicas, com ações de graças.” Filipenses 4.6

Nosso espírito deve ser como um lago cujas águas são sempre serenas durante todas as estações do ano, e cristalinas a ponto de refletir com maestria toda a luz lançada sobre ele; mas atualmente, a maioria das pessoas têm, inconscientemente, cultivado um espírito tão turvo e turbulento quanto as águas de um riacho furioso.

E o que é que isso tem a ver com Filipenses 4.6?

A característica mais marcante que podemos observar na nossa geração, e tem definido a sociedade atual é a inquietação; homens e mulheres, jovens, adultos, idosos e até crianças, todos repletos de vontades, desejos, sonhos, paixões e ambições incontroláveis, intermináveis e conflitantes se digladiando na mente, no coração e no espírito deles, produzindo uma "correnteza" revolta, constante, e um “ruído” massivo e caótico no interior de tais indivíduos que os acelera e distrai das coisas que realmente importam durante toda a vida; de fato, essa "correnteza" violenta e esse “ruído” interno ensurdecedor produzido pela inquietação no espírito é justamente aquilo que já está sendo considerado por muitos como o mal deste século; a ansiedade.

Então alguém pode questionar: Você está dizendo que a ansiedade é causada pela inquietação do espírito humano?

Sim. Exatamente. A ansiedade é uma reação da mente humana em resposta a uma causa mais profunda que é justamente a inquietação do espírito dos indivíduos. Um espírito inquieto faz “ramificar” e “ecoar” essa inquietação pela mente e coração da pessoa produzindo o que a ciência chama de ansiedade, que por sua vez vai gerar efeitos e sintomas devastadores na saúde mental, física e no estilo de vida de qualquer um. Eis o motivo de muitas pessoas estarem tentando, sem sucesso, combater a ansiedade que sentem; muitos estão gastando verdadeiras fortunas com ajuda psicológica, médica, farmacológica e mesmo assim não têm experimentado progresso significativo no combate à ansiedade que estão sentindo, tudo o que estão conseguindo é sentir uma espécie de "anestesia" superficial que perde o efeito em pouco tempo e logo são novamente açoitados pelos pensamentos, sentimentos e emoções gerados pela ansiedade. 

O que tais pessoas não sabem é que para que a ansiedade da mente comece, de fato, a ser dissolvida e desfeita por completo, de uma vez por todas, na vida de qualquer um, é preciso primeiro que o espírito de tal indivíduo se aquiete, pois quanto mais quieto for o espírito, mais calma e serena será a mente, do contrário tais indivíduos nunca conseguirão desenvolver verdadeira mansidão, que é paz interior, aquela paz que o próprio Jesus deixou à nossa disposição, como Ele mesmo revelou em João 14.27, que diz: "Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou, não vo-la dou como o mundo a dá...". E sem a paz de espírito a ansiedade estará sempre presente, ora mais forte e perceptível, ora menos, mas nunca se livrarão inteiramente dela. 

Na sociedade atual, há muitas ferramentas e técnicas sendo utilizadas para tentar diminuir os efeitos nocivos e os sintomas da ansiedade nas pessoas, e por mais que tais técnicas e ferramentas tenham seu valor, e se forem utilizadas com a devida sabedoria podem realmente ser úteis, até certo ponto; nenhuma delas conseguirá eliminar a ansiedade da mente dos indivíduos por completo visto que nenhuma dessas ferramentas e técnicas ataca a causa de tal ansiedade, que é a inquietação presente no espírito humano. Tratar a ansiedade da mente, mas deixar a inquietação do espírito sem "tratamento" adequado é como tentar enxugar uma rocha que está dentro de um riacho. 

O poeta e escritor Henry David Thoreau, cuja obra serviu como inspiração para Martin Luther King, disse certa vez que: "A maioria dos homens vive em um silencioso desespero"; tal afirmação é especialmente verdadeira ainda nos dias atuais (mais do que antes) e esse desespero silencioso nada mais é do que a própria inquietação do espírito humano que permanece sempre em segundo plano, subliminar, como um pano de fundo cinzento e difuso na mente e no coração das pessoas, ela não permite que os indivíduos encontrem e cultivem a paz de espírito ao mesmo tempo que distorce toda a capacidade de perceber a vida de maneira adequada, edificante e equilibrada; e, como se tudo isso já não fosse suficientemente ruim, tal inquietação ainda tem a capacidade de corroer e deturpar a fé; como Gálatas 1.7 revela ao dizer: "...Mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo.". Pessoas com o espírito inquieto tendem a tentar compartilhar essa inquietação com os outros ao redor, o máximo possível, e como foi observado pelo apóstolo Paulo na carta aos Gálatas, esse fenômeno também ocorre dentro das congregações.

E como tratar essa inquietação?

Primeiramente devemos identificar as distorções que essa inquietação produz para que assim, com a devida clareza e consciência possamos adotar práticas mentais e espirituais que vão neutralizar essa inquietação e dissolver a ansiedade.

Então quais são essas distorções?

A verdade é que há muitas, e várias delas são diferentes de uma pessoa para outra, de modo que não me seria possível abordar todas elas aqui em um simples texto como esse, porém há também aquelas que são mais genéricas e podem ser observadas na maioria dos indivíduos; e são essas que vou citar aqui; tenha em mente que embora sejam genéricas, isso não as torna menos nocivas, portanto é extremamente importante compreender que não podemos ignorá-las:

* Uma grande distorção que as pessoas inquietas demonstram é a sensação de que a vida não é suficientemente longa para que eles consigam fazer, e ter, tudo o que desejam; de fato, a capacidade de perceber a passagem do tempo fica drasticamente comprometida quanto mais a inquietação vai ganhando volume dentro dos indivíduos, por isso é tão comum vermos pessoas dentro e fora de congregações reclamando que o ano está passando rápido demais e que os dias parecem estar cada vez mais curtos.

* Outra distorção sintomática demonstrada por pessoas com o espírito inquieto é o desejo inegociável de realizar absolutamente todos os sonhos que estão dentro deles, mesmo os mais sem sentido, de uma maneira tal que nem se dão conta de que grande parte desses sonhos não é genuinamente deles, mas sim da sociedade, do Ego e do próprio espírito do mundo que os está influenciando dissimuladamente.

* Mais um efeito distorcido nas pessoas cujo espírito está inquieto é a aceleração da mente e do estilo de vida, todos os pensamentos, sentimentos, emoções e intenções de tais indivíduos estão cada vez mais rápidos dentro da mente deles de modo que vão ficando incontroláveis e frenéticos, e assim, fazendo com que o estilo de vida deles seja cada vez mais desgastante, confuso e pesado; tais pessoas acham que tudo deve ser feito ou acontecer no menor espaço de tempo possível, de preferência, "para ontem".

* Também há um sintoma que é a insatisfação constante que nunca os abandona, não importa o que tenham ou o que consigam conquistar na vida, nunca é o suficiente; eles estão sempre com a pesada sensação de que algo está faltando na casa, nas finanças, no trabalho, no lazer, na família, nos relacionamentos, nos pensamentos, nas questões espirituais e em absolutamente tudo que faz parte da existência deles.

Não é preciso fazer muito esforço para perceber que a ação combinada de todas essas distorções da inquietação que tem afligido as pessoas na sociedade, e em congregações, é a receita certa para transformar a existência de qualquer um em uma caminhada repleta de sofrimento auto imposto, infelicidade, desarmonia e uma profunda sensação de miséria interior; tudo isso potencializado por muita ansiedade; mesmo entre indivíduos socialmente vistos como bem sucedidos. Eis um dos motivos pelos quais há atualmente cada vez mais empresários(as), médicos(as), artistas, líderes religiosos, políticos, celebridades, executivos(as), atletas e tantos outros indivíduos com posições sociais de destaque, mas cuja mente está à beira de um colapso.

Infelizmente, tal panorama não tem acontecido apenas com pessoas socialmente destacadas, mas sim com uma porção cada vez maior da sociedade, desde aqueles com uma situação de vida de escassez até bilionários, todos padecendo dessa mesma "enfermidade" espiritual, a inquietação. O fato é que o espírito do mundo espalhou seu manto sombrio de inquietação sobre boa parte da humanidade para tornar as pessoas em criaturas cada vez mais alvoroçadas, iludindo os indivíduos com uma quantidade massiva de ilusões e fantasias sociais para que não percebam a verdadeira vida que possuem e está soterrada sob toneladas de inutilidades douradas.

Então é aqui que entra uma das práticas espirituais a qual os cristãos genuínos se dedicam diariamente, que é o cultivo da quietude. E como fazer isso?

Exatamente como o texto de Filipenses 4.6 ensina, ou seja, fazendo com que nossas petições sejam, em tudo conhecidas diante de Deus, através das orações, súplicas e com ações de graça.

No passado todas as petições dos verdadeiros cristãos diante de Deus estavam intimamente ligadas apenas às suas necessidades mais básicas como alimento, saúde, abrigo, vestes, trabalho e remuneração digna; da mesma maneira que as orações e súplicas estavam sempre sustentadas pela fé genuína e direcionadas pela esperança e pelo amor, a Deus, ao próximo e a eles mesmos; enquanto nutriam profundo senso de gratidão ao Altíssimo, uma vez que tais coisas básicas e simples da vida eram providas, mesmo que em poucas (porém suficientes) quantidades. Então, por causa desse tipo de comportamento o espírito deles permanecia sempre em paz, de modo que a inquietação da natureza humana não conseguia se enraizar neles para perturbá-los, e assim ficavam livres e imunes à todas as ansiedades sociais que o espírito do mundo tentava lançar sobre eles, mesmo em momentos extremamente delicados.

Atualmente, porém, a inquietação do espírito humano está cada vez mais forte porque as pessoas da sociedade não têm o maravilhoso hábito de fazer orações e súplicas genuínas, nem de cultivar uma mente agradecida pelas dádivas que possuem, mesmo que sejam poucas; de fato, tais pessoas não sabem que orações e súplicas genuínas acalmam o espírito com esperança e amor. Infelizmente, muitos dentro de congregações também estão sendo vítimas crônicas dessa inquietação e de seus vários efeitos e sintomas porque, embora façam suas petições, súplicas e orações diante de Deus, tais petições estão majoritariamente ligadas a todo tipo de coisas supérfluas, assim como suas orações e súplicas estão geralmente sustentadas por uma fé vaidosa, egocêntrica e direcionadas por sonhos de consumo sem sentido, paixões, desejos repetitivos, ambições, egoísmo, narcisismo, hedonismo, megalomanias e outras coisas semelhantes; como o texto de Tiago 4.3 deixa claro ao afirmar: "Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes com em vossos deleites.". Além disso, por causa do tipo de petições, orações e suplicas distorcidas que fazem, não conseguem nutrir em si mesmos quase nenhum senso genuíno de gratidão a Deus, mesmo que estejam vivendo em tempos de tranquilidade e abastança. Qualquer um cuja pratica espiritual se resuma a esse tipo de procedimento jamais conseguirá desenvolver verdadeira paz de espírito e continuará como um mero fantoche da própria inquietação.

Se realmente desejamos que nosso espírito esteja em paz, se realmente desejamos usufruir plenamente dessa paz em nosso cotidiano, mesmo em meio a momentos tempestuosos, precisamos fazer com que nossas petições, orações e súplicas sejam cada vez menos contaminadas com as distrações, ilusões e fantasias que infestam a sociedade; em outras palavras, se tudo o que queremos de Deus é que Ele nos conceda mais dinheiro, mais roupas e mais coisas para impressionar os outros, status social, poder, reconhecimento, fama, influência e todos os tesouros sociais pelos quais os indivíduos da sociedade estão se sacrificando loucamente para possuir na vida, então a inquietação dentro de nós continuará aumentando e nos fazendo sentir miseráveis mesmo se alcançarmos tudo o que estivermos buscando; como o texto de 1 Coríntios 15.19 afirma quando diz: "Se esperarmos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens.".

Quando, conscientemente e intencionalmente, voltarmos nossas petições, orações, suplicas e ações de graça para o que realmente importa, a inquietação no nosso espírito começará a se desfazer assim como os efeitos dela, dentre os quais a ansiedade, entre outros. Esse é o momento em que começaremos a experimentar a verdadeira e profunda paz de espírito que protegerá nosso coração e mente das aflições da vida. No livro O fim da ansiedade, o pastor e escritor Max Lucado diz: "A paz vem quando as pessoas oram."; e eu acrescento que a paz realmente vem quando as pessoas oram de verdade, sem deixar que suas orações, petições e súplicas sejam produzidas ou atraídas e dirigidas pelas mais diversas ilusões, fantasias e deformações da sociedade, o que infelizmente tem ocorrido bastante atualmente.

E como fazer isso?

Em Efésios 6.18 está escrito: "Orando em todo tempo com toda oração e súplica no Espírito..."

A oração no Espírito alimenta a paz do nosso espírito; e, orar e suplicar no Espírito significa retirar o nosso Ego das orações, ou seja, vá retirando de suas petições, orações e súplicas, toda ambição, toda paixão, toda vaidade, todo egoísmo, todo narcisismo, toda megalomania todo sonho sem sentido, todo desejo por vanglória e qualquer coisa semelhante a essas que você puder identificar dentro de si. Acredite, todos nós ainda temos muito dessas coisas se acumulando livremente, disfarçadas em nosso interior, e são elas que contribuem imensamente para nos deixar profundamente inquietos, dia e noite. Observe atentamente tudo o que está em seu interior e você começará a identificar todas essas coisas do Ego claramente.

Não é o nosso Ego que deve orar, de fato, nós nunca devemos deixá-lo fazer isso, porque o Ego é carne, logo, não compreende e é oposto às coisas do Espírito, embora saiba se fingir de espiritual muito bem. Se permitirmos que nosso Ego ore (e muitos têm feito isso por décadas), nossa inquietação será cada vez mais acentuada, pois nossas orações não serão espirituais, mas sim naturais e até carnais. Quando começamos a eliminar o Ego, separando-o completamente das nossas práticas espirituais (orações, petições, suplicas, ações de graça, e outras), perceberemos que a paz real já estará presente em nós, pois será "desenterrada" de sob essa quantidade absurda de inutilidades; e essa paz dominará abundantemente nosso espírito, desintegrando toda e qualquer inquietação que tente nos afligir, assim como qualquer ansiedade que a sociedade e o espírito do mundo lancem sobre nós.    


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